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22.10.04

Quando éramos 2

Houve um tempo em que nós éramos 2. Para o que quer que fosse, éramos eu e ele. Para festar ou quando precisávamos de alguém para desabafar, nós nos encontrávamos, só os 2. Ele ouvia meus problemas, eu consolava as tristezas dele. Conversávamos muitas horas a fio, às vezes sem nem ter sobre o que falar. Nos conhecíamos. Sabia o que ele gostava de fazer; ele evitava o que me deixava triste. Nossas individualidades não precisavam estar expostas, pois éramos capazes de apontar o local onde elas se escondiam. Eu era um, ele, outro; juntos, éramos 2.
Mas aí vieram outros. E fomos nos tornando 3, 4, 5... No final, viramos um grupo grande, um aglomerado de 8 ou 9 pessoas que era bom para as festas. E só. Toda a relação que se firmava no cerne de nosso bando não diferenciava em muito de um contrato, um mero acordo de participação. Nada parecia mais intenso nem mais verdadeiro do que aqueles momentos do passado quando nossos olhos se cruzavam em silêncio e tudo o que ele queria me dizer eu lia em seus olhos. Nossas pessoalidades se perderam. Deixamos de nos falar, mesmo estando no mesmo grupo. Nesse tempo, parecia que 3 minutos conversando sobre nós mesmos era tempo demais. Raramente ficávamos mais de 1 minuto sem que um terceiro ou um quarto nos interpelasse. Aos poucos fomos deixando de nos conhecer, apesar de sempre estarmos juntos. Perdidos naquele grupo, compartilhamos risadas vazias que duravam apenas um átimo antes que a tristeza tomasse conta de nós tão logo passássemos a nos sentir sozinhos mesmo estando entre tantos outros. Eu deixei de ser um; e assim também o fizeram todos os demais. Abdicamos de nossas individualidades em favor do interesse comum. Aquela cumplicidade tão gostosa de outras épocas foi substituída pela desconfortável vergonha de olharmos um nos olhos do outro. Nos tornamos pedaços daquilo que éramos. Viramos partes. Descartáveis e sem importância. Se um não estivesse ali, que falta fazia? Havia todos os outros...
Assim, de um jeito que só me fez sentir falta do passado em que éramos só eu e ele, deixamos de ser 2... e passamos a ser nenhum.
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